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26 de abril de 2024
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Ricardo Gondim faz reflexões sobre o comportamento do evangélico

Palestra " Repensar a fé para uma vida melhor". Igreja Betesda em Picos-PI. foto: arquivo pessoal

 

Ricardo Gondim Rodrigues é teólogo brasileiro, escritor, conferencista, presidente nacional da Igreja Betesda. Tem programa de rádio e é colunista de vários veículos de comunicação. É autor premiado de vários livros e artigos polêmicos. Nesta entrevista ele expõe sua opinião sobre os evangélicos na política, a homossexualidade, o drama humano e o suicídio.

Palestra " Repensar a fé para uma vida melhor". Igreja Betesda em Picos-PI. foto: arquivo pessoal
Palestra ” Repensar a fé para uma vida melhor”. Igreja Betesda em Picos-PI. foto: arquivo pessoal

 

“A única solução para uma transformação de um país é uma transformação através do estado laico e não através de pretensas teocracias.”

“O evangelho é um preparo para o enfrentamento da vida com tudo aquilo que ela tem.”

” Não muda nada, as pessoas serem hétero ou homossexual. São pessoas normais que tem uma peculiaridade de se interessarem, de gostarem, de sentir-se atraídos por pessoas do mesmo sexo. “

 

Maria Nilza: Pastor Ricardo, eu queria saber seu ponto de vista sobre o posicionamento dos evangélicos dentro da política. Pergunto isso porque , o que eu tenho observado é que seus projeto estão muito mais verticalizados, num plano mais sobrenatural do que no real. Não vejo projetos relacionados ao social, a ajudas humanitárias, estão longe do princípio de Jesus que era do amor ao próximo, do partilhar o pão e, muito longe, principalmente do “ vender o que tem e dar aos pobres”. Queria saber seu ponto de vista a partir da atuação dos religiosos dentro da política brasileira.

Ricardo Gondim: A minha posição é de que a igreja evangélica, não tem propriamente um projeto político, no sentido mais nobre da palavra. As igrejas evangélicas, de um modo geral, têm projetos de poder, de conquista de poder. E este projeto de conquista de poder é movido basicamente pela ideia de que as igrejas evangélicas detém, espiritualmente, a capacidade de mudar Brasil. O que isso é uma tolice, porque este país, para ser mudado, não vai ser a partir de categorias espirituais. Este país será mudado, a partir de categorias de transformações sociais e inclusive de revoluções. Porque há alguns setores que só uma revolução pode ser capaz de efetivamente mudar as estruturas deste país. Então as igrejas evangélicas, de uma maneira geral, que entraram na politica, entraram por um projeto de poder. E um exemplo claro que nós temos agora é, a igreja universal disputando a prefeitura do Rio de Janeiro, através de um bispo, o Marcelo Crivela. O projeto da igreja universal no Rio de Janeiro é um projeto de poder, ela não tem efetivamente um projeto político, ideológico, de transformação da cidade, através de movimentos sociais, de setores de envolvimento social. Então, a maioria destes candidatos, que as igrejas oferecem, na verdade são meninos de recados de suas lideranças. Dos caciques, dos bispos e apóstolos que dirigem as igrejas. O que é lamentável, porque a política requer uma experiência em lidar com as demandas sociais, muito grande. E aquele que entra, sem este preparo ele acaba ou cooptado por aqueles que detêm o poder, pelas forças do poder. Ou ele é completamente desfigurado porque as “tentações” e eu vou usar aqui uma expressão religiosa, as “tentações” do poder político são exageradamente grandes e, aqueles que não estiverem devidamente treinados para lidar com as tentações do poder, acabam se tornando verdadeiros monstros. E estes pastores não percebem este erro. Que na verdade eles estão conspirando contra si mesmo. A única solução para uma transformação de um país é uma transformação através do estado laico e não através de pretensas teocracias. O laicismo que é a total separação do poder do estado e da religião, e das instituições religiosas, essa separação esta ruptura, que não é nova ela inclusive parte de do movimento dos Anabatistas, por exemplo que aconteceu na Europa do século XVI, desde o século XVI que se propunha um rompimento radical entre a religião e o estado. Então, o laicismo, e os pastores também não percebem isso, na verdade uma defesa para a igreja, porque da mesma maneira que o estado não pode ter interferência da igreja, a igreja não pode ter interferência do estado. E quando os pastores violentam esta fronteira, eles estão conspirando contra sim mesmo. É um tiro no pé.

Maria Nilza: Em uma de suas reflexões, A brisa no amargoso, um conto que fala da personagem Cícero e de sua tragédia nordestina, ele é religioso, devoto de padre Cícero que também no conto, encontra uma irmã, que seria uma evangélica padecendo a mesma dor, o mesmo drama do ser humano aqui na terra, né? Então, eu achei interessante porque você mostra o ponto de vista diferente daquele que pregado nas igrejas, principalmente naquelas mais populosas, que pregam soluções. O conto me mostrou que a miséria humana é independente de uma divindade. Como se dependesse dos seres humanos e de suas ações, Eu queria saber se esta é sua opinião ou se interpretei de maneira equivocada.

Entrevista a Sheila Fontenele no Jornal Picos Notícia- TV Picos. Foto: arquivo pessoal
Entrevista a Sheila Fontenele no Jornal Picos Notícia- TV Picos. Foto: arquivo pessoal

Ricardo Gondim: Não, não. Você interpretou corretamente, o livro do Eclesiastes diz com todas as letras no capitulo de numero 09 que aquilo que sofre o justo, sofre o injusto. Que aquele que sacrifica e aquele que não sacrifica padecem da mesma sorte, porque nós somos passageiros do mesmo barco nós somos viajantes da mesma história, e seria, inclusive uma tremenda injustiça divina premiar uns e deixar outros ao léu. E premiar uns porque fazem parte do seu redil, fazem parte do aprisco e abandonar os outros, porque não fazem parte do aprisco. Então, o evangelho não é uma capa de proteção, não é uma redoma de proteção. O evangelho é um preparo para o enfretamento da vida com tudo aquilo que ela tem. É uma consciência cidadã que se desenvolvem em nós, de que a responsabilidade de transformar o mundo não é dos anjos nem de Deus, é nossa. E essa responsabilidade foi nos dada no jardim do Edem quando Deus disse “você vai e cultive o jardim, cultive o pomar.” Se nos queremos ver transformação, não adianta pedir a Deus não adianta pedir ao padre Cícero, e nem adianta pedir a Jesus Cristo, nós temos que arregaçar as mangas e fazer a diferença.

Maria Nilza: Outra crônica, Aos homoafetivos, o ombro de Deus, que gostei muito por sinal, me emocionou, foi a que conta a história de um padre que era homossexual e suicidou-se. A partir disso, eu soube da entrevista que você concedeu à Carta Capital, e da perseguição que sofreu por parte dos religiosos, devido ao seu posicionamento. Queria que você me falasse um pouco de seu ponto de vista em relação ao homossexualidade.

Ricardo Gondim: Eu tenho hoje consciência absoluta de que a minha relação com esse padre ( que se referiu na crônica) foi uma relação salvadora para mim. Porque eu não considerei em nenhum momento ele como promíscuo, como pecador, um endemoninhando, como alguns outros padres o consideraram e, como os pastores o consideraram. Pelo contrário, eu, ao conhecê-lo, vi e que ele era uma pessoa muito bonita, muito digna, e que o suicídio dele foi… foi um homem que arqueou debaixo de um peso que foi excessivamente colocado sobre ele. Isso mudou a minha relação de percepção. Porque acho que muitos dos nossos preconceitos, é porque a gente não conhece essas pessoas, porque a gente não dialoga com as pessoas. E eu mudei a minha percepção porque hoje entendo que homossexualidade, não é uma questão de escolha, não é uma questão de perversão, não é uma questão e pecado. A homossexualidade é uma condição humana. Eu por exemplo sou canhoto e a minha “canhotice” não foi uma escolha minha pelo contrario, eu quando era criança, cresci em fortaleza, as pessoas consideravam feio usar a mão esquerda e eu tentei algumas vezes escrever com a mão direita, mas não consegui porque nasci assim, eu sou assim. Eu acho que algumas pessoas são assim, e isso não aumenta, não diminui, não altera absolutamente em nada a questão do caráter, a questão da beleza humana que ele tem, tanto faz ser homossexual. Não muda nada, as pessoas serem hétero ou homossexuais. Então eu mudei , eu acho que eles existem, eles estão ai, e nosso papel é o de vê-los não como pessoas estranhas, esquisitas, pessoas diferentes. São pessoas normais que tem uma peculiaridade de se interessarem, de gostarem, de sentir-se atraídos por pessoas do mesmo sexo.

Maria Nilza: A reflexão da qual falamos abordou também outro tema delicado, que é o suicídio. Aqui no Piauí, atualmente, têm acontecido muitos casos de suicídios. Como o senhor encara este tema?

Ricardo Gondim: Eu nunca digo que uma pessoa se mata. Essa pessoa tinha uma doença que o matou. Essa doença pode ser uma depressão, pode ser paranoia, alguma coisa desencadeou uma doença interna emocional, psicológica, que o matou. Então eu tenho para com os suicidas uma relação de muita compaixão. Eu acho que é um gesto tresloucado, é um gesto completamente ensandecido de uma pessoa. E que o suicídio deve ser prevenido. Uma das maiores causas do suicido é a depressão, não é nenhuma melancolia, é uma depressão patológica, as pessoas estão doentes, precisam ser tratadas. Não se resolve a questão da depressão com consumismo, ir fazer umas compras, não resolve com religião, orar mais, rezar mais, não resolve, a pessoa precisa ser tratada. É uma doença. A pessoa precisa ser acompanhada por um especialista nestes distúrbios mentais. Então eu sempre digo às pessoas que tem essa tendência, que tem uma fragilidade em relação ao suicídio, que antes que isso se torne avassalador procure ajude, procure conversar com um especialista, com um psicólogo, psiquiatra, que lhe ajude antes disso acontecer porque o suicídio não é solução. É um salto destruidor para própria pessoa e todas as pessoas, que muitas vezes nem merecem, nem deve passar por aquela dor que o suicida causa.

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